Ninguém parece perceber este fenómeno da Apple. Não me refiro ao seu trajeto de empresa à beira da falência, até o momento em que se torna a empresa mais valiosa do mundo, com quase $100 mil milhões de USD em cash e com as suas ações acima dos $700 USD.
Refirmo-me sim à força da marca Apple continua a ter, quer na mente dos consumidores, quer no interesse gerado em torno de cada noticia publicada sobre a Apple.
As próprias expectativas criadas fazem com que muitos tenham posturas pouco coerentes, nada ajudado pela pressão de fazerem parte dos poucos “felizardos” que são convidados para estarem presentes nos eventos da Apple.
Muito antes do iPhone 5 ser lançado, os rumores começaram a surgir em todos os meios de comunicação, em praticamente todos os países que têm imprensa. Na luta para conseguir o maior numero de visitas online, as publicações, sejam elas profissionais ou amadoras, os media já se aperceberam há muito tempo que o tema Apple tem sempre um forte interesse pela comunidade geral online – são os artigos mais vistos, mais partilhados e mais comentados.
A euforia resulta num numero infinito de artigos que vão dos mais ridículos rumores até aos mais óbvios – o próximo iPhone vai ser mais rápido. Sério? Na realidade, ninguém está tecnicamente errada, pois esta informação vem sempre de “pessoas com conhecimento na matéria”, a frase mais utilizada pelos jornalistas que não conseguem exercer a sua arte da forma mais profissional – na ausência de fontes credíveis, a noticia não é noticia. Mas o departamento comercial irá certamente ter uma palavra neste assunto – sem page views, não há publicidade e consequentemente não se paga as contas. Está provado que este modelo é ineficaz.
No caso do lançamento do iPhone 5, e também o do iPhone 4S, as expectativas criadas refletiram esta necessidade de criar uma noticia onde não existia noticia. Ou seja, para quem na verdade tem acesso às tais “pessoas com conhecimento na matéria”, deveriam se ter apercebido que o iPhone, após a sua alteração de design para o iPhone 4, iria em grande parte manter o exterior, atualizando a tecnologia no seu interior.
Para uma empresa que tem somente um produto num especifico segmento, não se espera que existam profundas alterações no design, especialmente quando o mesmo vende milhões de unidades por trimestre, num segmento que ainda tem capacidade de comportar muitos mais milhões de unidades – especialmente tendo em conta que para todos os efeitos, nem estamos a contar com a China.
Mais, as “pessoas com conhecimento na matéria” deveriam ter em conta que a Apple está há uma década a construir o seu negocio em cima de um único ecossistema, demonstrado nos últimos lançamentos, que é bem possível que no futuro exista só um único sistema operativo iOS, quer para os Macs, quer para todos os outros produtos.
Mas os media escolheram ir por outro caminho novamente. Iniciam os rumores, sem qualquer fundamento, vão focando naqueles que gerem mais interesse, lançam alguns boates que sabem que a Apple não vai comentar, e chegam ao evento para transmitir ao vivo, através do live blogging, tudo que se passa naquela sala reservada para os poucos escolhidos.
A ultima coisa que um jornalista quer, é ser excluída da A list dos eventos da Apple, quer por questões pessoais (ego, influência, etc), quer por questões profissionais – o convite da Apple infere um valor acrescido ao seu poder interno como jornalista. Mas a pressão que a Apple coloca naqueles que escolhem questionar ou até fugir à etiqueta do evento, faz com que todos sigam o mesmo rumo. Existem inúmeros jornalistas que nunca mais foram convidados por as mais variadas razões – desde dizerem mal, quebrarem o silêncio ou até tentarem falar com o Steve Jobs após o evento, num dos corredores ao verem ele passar.
E assim temos este ciclo caricato de eventos em torno de cada evento da Apple. Rumores (construtivos) antes do evento, presença no evento, uma reportagem pos evento moderada em que falam sobre o iPhone como o melhor smartphone na ausência de grandes novidades, só para uma semana depois dizerem maravilhas. Porquê uma semana depois? É quando o embargo, ordem de silêncio assinado por todos aqueles que receberam um iPhone 5 antes de qualquer outra pessoa, para mais tarde escreverem sobre o mesmo, é levantado. De repente, no mesmo dia, os mesmos jornalistas que questionaram a falta de inovação, escrevem maravilhas sobre o iPhone. Mas ele é um optimo semartphone, especialmente desde o iPhone 4, razão essa que nada me leva a trocar o meu.
A Apple conseguiu assim ter a imprensa exatamente onde a quer. Criam um enorme buzz meses antes do evento, deixam o evento desiludidos mas com o novo iPhone que mais ninguém tem – dizem bem do evento. Uma semana depois, ao puder escrever sobre o mesmo, sai de repente um dilúvio de criticas positivas, pois ninguém quer ser aquele que não mostrou ter um iPhone antecipadamente – o efeito é quase perverso.
Para o consumidor, nada disto tem grande interesse, até porque não é no Engadget, TechCrunch, Mashable ou todos os outros sites, que a minha mãe, a sua, ou a de um americano numa cidade do Texas, que o consumidor vai buscar informações para decidir. Este vácuo alimenta-se a si próprio e pouco impacto tem na decisão de compra.
É nas lojas da Apple, através dos seus anúncios, e nas mãos de quem já tem um produto da Apple, que os consumidores vão decidir comprar, ou não, um iPhone. A confusão de todos as outras variantes de smartphones com diferentes versões de Android nada ajudam à decisão para quem pouco ou nada percebe do assunto e encontra-se numa loja com o iPhone e dezenas de outras alternativas.
Mas o produto é muito bom, como são vários outros, e o preço já não é diferenciador no processo de compra, dado que o iPhone 5 tem preços iguais ao Galaxy SIII, sendo mais barato numa das versões.
Uma coisa é certa, independentemente de que lado fica no Android/Samsung vs. iOS/Apple, não podemos negar que ambos dominam presentemente o mercado de smarthones, deixando todos os outros para trás.
O que está verdadeiramente mal é o facto que o jornalismo (especialmente online) está cada vez mais integrado com os interesses comerciais das grandes publicações. É que com o modelo de negocios que escolheram, não têm grandes alternativas. E todos vão continuar a faze-lo enquanto houver interesse neste tipo de cobertura, e como referi no inicio, artigos sobre a Apple tem sempre um elevado interesse online.
imagem: idownloadblog
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