Para quem ainda lê os jornais, ouve a TSF e vê as noticias, ou já desenvolveu um cinismo que lhe filtra tudo relacionado com a economia, ou então está à beira de uma depressão. Para quem ficou desempregado, teme o seu futuro no seu emprego atual ou procura mudar de onde está, irá existir sempre uma altura em que pensa no que daria trabalhar para si próprio. Este pensamento é normalmente anulado pelo FUD – fear, uncertainty and doubt.
Mas no meio desta recessão, empreendedores estão a surgir, muitas vezes, de onde nunca imaginávamos ser possível. É que o empreendedorismo é muitas vezes associado à tecnologia, Silicon Valley, pessoas de dinheiro, investidores ou até a jovens que ainda não se aperceberam da crueldade do mundo que lhes enfrenta – naive.
Mas existe uma classe diferente de empreendedor – empreendedores por acidente ou por força das circunstâncias. Com poucas ou nenhumas opções, um total desencanto pelas presentes circunstâncias e um desespero com o que lhes espera, estes empreendedores não tomaram a opção de trabalhar para si próprios, optaram meramente por cuidar de si mesmo. Estão a reaver o controlo que perderam pelo caminho.
A Kauffman Foundation lançou o índice de atividade empreendedora que demonstrou um aumento na criação de novos negócios durante a crise económica que já se arrasta desde 2008. Os resultados demonstraram um padrão interessante – um aumento no empreendedorismo por necessidade comparado com um declínio no empreendedorismo por oportunidade. Ou seja, a crise e falta de opções estão a levar à criação de novos negócios, não por opção, mas por necessidade.
Estudos de investigação no crescimento pós-traumático revelaram que algumas pessoas tornam-se mais resilientes quando enfrentadas com a adversidade, escreveu Shawn Achor da Universidade de Harvard. A criatividade surge enquanto se adaptam a uma nova situação. O seu cérebro está efetivamente aprender mais depressa do que quando não se sentiam desafiados. O resultado são os empreendedores por acidente que conseguem um crescimento no meio de uma crise.
Estes indivíduos nunca imaginaram criar uma empresa mas a economia forçou os a utilizar a sua criatividade, e muito louco que pareça para os seus pares, a decisão foi totalmente derivada de necessidade.
Interessante é que, para muitos, o empreendedorismo numa recessão parece ser um contra senso, sendo que numa altura de maior incerteza, a segurança deveria prevalecer. Mas o que está a contribuir para esta mudança de percepção de risco é a opinião que as pessoas t~em hoje em dia sobre a segurança de emprego e de contratos. A maioria já percebeu que o mundo em que a empresa garantia emprego, já era.
Esta alteração de mindset não é nem racional nem decidida com reflexão. É que as pessoas que ficam desempregadas acabam sempre por ir procurar emprego noutras empresas. O que acontece é que com tempo, as pessoas são forçadas a procurar outras alternativas, sejam elas noutras industrias, noutro regime (part time) e/ou por um valor muito inferior ao que recebiam antes de ficarem desempregadas. Quando estes caminhos esgotam-se, para alguns, inicia-se o mecanismo de sobrevivência e tudo passa a ser uma opção viável – o risco, ou percepção de risco, desaparece por completo.
Mas o risco de abrir atividade em nome próprio não pode ser subestimado – 2/3 de negócios criados sobrevivem pelo menos dois anos, baixando para 44% após 4 anos e 31% a 7 anos. Não é por acaso que as pessoas que não se ligam emocionalmente ao seu negocio e vendem o cedo, têm normalmente uma maior taxa de sucesso e retorno.
O que poderá surpreender muitos é que estas taxas de insucesso não aumentam durante uma recessão. Ou seja, o facto de estarmos numa recessão, não deveria inibir empreendedores de seguirem em frente, em vez de esperarem por melhores tempos. O que muda é a razão por embarcar nesta aventura.
Ernst & Young concluiu num estudo de 2009 que a “experiência demonstra que empreendedores não deveriam desistir numa recessão.” Muitas das maiores empresas foram criadas numa recessão, como por exemplo Starbucks, Intuit e PetSmart. Estudos da Kauffman verificaram que mais de metade das empresas do Fortune 500 e praticamente metade das empresas na revista Inc. 2008 foram criadas numa recessão.
GoBankingRates produziu um infographic que demonstra a correlação entre uma crise económica e o inicio de atividade de empresas no Fortune 500.
O próprio processo de abrir uma empresa tornou-se muito mais fácil e acessível a praticamente qualquer um. Os custos associados com o inicio de atividade também diminuíram para valores que fazem com que algumas empresas de uma pessoa parecem ter dezenas de pessoas a trabalhar lá – a tecnologia permitiu termos acesso a ferramentas e informação gratuita que nos ajudam a concretizar a maioria das tarefas de gestão, comunicação e marketing.
Empresas têm surgido para dar face a este nicho de pessoas dedicadas e focadas mas mal equipadas para enfrentar o mundo de empreendedorismo. UnintentionalEntrepreneur, é um site que disponibiliza informação, formação e apoio a este nicho de empreendedores. Outras como a InfoStreet vende software de gestão a preços baixos especificamente para pequenas empresas no seu inicio de operação.
Seja por opção ou por obrigação, a experiência adquirida na criação de um negocio é algo que irá ajudar a enriquecer a pessoa em termos pessoais e profissionais, especialmente se conseguir liderar bem com o falhanço e perceber que tudo começa pequeno com poucos ou nenhuns recursos.
Curioso é ver que os bancos, nos Estados Unidos, financiam uma pequena fatia de novas empresas – boas noticias pois podemos todos esquecer o financiamento por parte do banco – e acredite que isso não é nada mau, pelo contrário.
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