É de facto incrível como Steve Jobs conseguiu manter o secretismo central à cultura da Apple. Nem mesmo depois de anunciar, pela ultima vez, que iria sair da Apple, conseguiu algum tabloide fotografias ou informação de médicos despostos a vender a sua tão preciosa informação.
Para uma empresa que luta por uma imagem de transparência, algo não bate certo. Tudo que fazem internamente para manter o secretismo é contra o que se aprendeu em Business School. Produtividade não é afectada na Apple pela falta de transparência interna.
Todas as empresas tem segredos, mas na Apple tudo é um segredo e é assim que consegue incutir esta forma de estar na cultura interna bem como nas relações comerciais externas.
A loja no campus da Apple tem uma t-shirt com o slogan: “Eu visitei o campus da Apple mas a única coisa que posso dizer é que estive lá”. Tudo que a Apple faz, o secretismo está embutido. Não há forma de fugir. Um ex funcionário descreve Apple como “the ultimate need‑to‑know culture”.
No caso da Apple, o segredo é mesmo a sua alma do negocio. Aqui também acho incrível como é que é possível uma empresa tão grande, com tantos empregados, tantos fornecedores espalhados pelo mundo, e ninguém consegue saber como e quando vamos ver o iPhone 5.
Os seus produtos são ubíquos mas a informação da empresa escassa – e a Apple faz tudo para manter o segredo. Reuniões secretas e produtos desenvolvidos com um nível de segurança que iria impressionar a CIA, Adam Lashinsky da Fortune, revela o que está por de trás deste secretismo todo.
– Quando o pladur chega: quando o seu cartão já não lhe dá acesso a uma especifica área, algo se passa. Mas não pergunta. É uma questão de horas – carpinteiros chegam, paredes aparecem, protocolos de segurança implementados, vidros foscos e voilá – algo novo se passa na Apple. Ninguém pergunta. Se não lhe disseram é porque não vai, nem deverá querer, saber.
– Guantanamo Bay: As semelhanças são muitas com a Apple Campus, a única diferença é que se pode sair. Tudo o resto é um completo segredo – as regras não são iguais ao mundo corporativo exterior. E a tortura? Para quem leu a autobiografia de Steve Jobs, verificou que de facto muitos foram torturados pelo próprio durante anos – por menos mentalmente. Ninguém, além dos seus empregados, tem acesso à Apple, pode sim passear pelos jardins para dizer que esteve lá, ao contrario da Google onde se pode entrar e ter visitas guiadas.
– Os Novos Recrutas: Para quem quer trabalhar na Apple, e a maioria até deve querer, o entusiasmo é tanto por ser aceite que nem questionam o facto que não lhes dizem para onde vai trabalhar ou o que vai fazer. Para os poucos que sabem, não dizem. O risco é imensurável. Acabaram afinal de se juntar a um culto– a seita da maçã. E como os grupos de alcoólicos anónimos, fica desde o inicio com um sponsor – alguém a quem pode ir falar, mas não assume que o que fala é segredo. Afinal, os segredos são da Apple, não dos seus colaboradores.
– O briefing de segurança: Se existe algo que todos se lembram, é do briefing que receberam dos responsáveis pela segurança na Apple. O valor do secretismo está nos milhões e por isso, qualquer informação que seja revelada intencionalmente ou sem querem, leva à terminação imediata. Imagino que alguns ficaram na duvida se seria uma terminação de contrato ou vida.
– O Design: Jonathan Ive assinou um contrato novo de $60 milhões de USD no ano passado – que não haja confuso nenhuma da sua importância para a Apple. Ive é responsável pelo design na Apple e poucos, muitos poucos incluindo executivos, têm acesso a ele e ao seu local de trabalho. Todo o marketing e PR gerado pré lançamento é graças ao secretismo do produto e do seu design. O tempo de resposta da concorrência é assim também limitada como se viu a tragédia de lançamentos de tablets a tentarem competir com o iPad.
– What Happens In Apple Club, Stays In Apple Club: Poderiam bem ser algo do Fight Club, mas não é. Engenheiros não podem falar sobre o seu trabalho e não é só a empresa que monitoriza. A própria cultura faz com que a maioria dos colaboradores que já estão na Apple há alguns anos acabam por assegurar que os seus colegas não tenham um momento de fraqueza.
– Repetição, Repetição, Repetição: Steve Jobs era conhecido por acabar a maioria das reuniões a dizer que tudo que tinham falado era confidencialidade e caso alguém decidisse quebrar esse silencio, não só seria terminado bem como processados com todo o poder e dinheiro da Apple – e não estamos a falar dos tribunais de Portugal. Os processo podem ser rápidos e dolorosos – mentalmente e financeiramente. Alguns executivos dizem hoje ter tido constantes pesadelos relacionados com esta pressão continua. Afinal, não tinham decidido trabalhar para os serviços secretos. Ou tinham?
– Permissões: Apple criou um sistema de disclosure para obrigar o cumprimento de todo o secretismo. Antes de falar sobre um tópico, cada um tem que se certificar que a pessoa com quem vai falar, tem o necessário nível de acesso, disclosure. Em reuniões, todos têm que estar devidamente identificados com as suas respectivas autorizações.
– O Puzzle: Apple utiliza a mesma filosofia incorporada em empresas que trabalham para os ministérios de defesa. Tenho um amigo em Inglaterra que é um executivo numa empresa que faz submarinos. Nem ele tem suficiente informação para saber como o submarino é construído nem quais as peças necessárias. Na Apple, o mesmo ocorre. Todos trabalham nas suas peças individuais que depois são vistas num todo pelo mínimo de pessoas possível. A Al-Qaeda funciona da mesma forma – terroristas que pertencem a células mas não tem a mínima ideia quem são os outros nem o que fizeram ou vão fazer. Uma comparação interessante.
– The Untouchables: Existe uma pequena equipa de executivos que gere a empresa aconselhando o CEO, Tim Cook. Não existe hierarquias nem gráficos da hierarquia. Existe ainda os que pertencem à DEST (Distinguished Engineer/Scientist Technologist), aqueles que sempre trabalharam diretamente com Steve Jobs durante anos e ninguém os pode tocar, provavelmente literalmente – Jonathan Ive é um deles.
– À Porta Fechada: Não existe o conceito, mais Americano, da porta aberta. Todas as portas estão sempre fechadas. Existem silos dentro de silos e ninguém pode entrar em áreas onde não exista uma necessidade – sem ser as casas de banho, assumo eu. Pode até ter acesso a locais que o seu patrão não tem – a necessidade reina e não a hierarquia.
– Pilha de Nervos: O secretismo quase obriga a que nunca se pare, para falar, comentar ou simplesmente descansar. Os colaboradores, tão focados no que estão a fazer e a importância da sua prestação no ecossistema principal, acabam sempre por correr de um lado para outro, nunca atrasados. A concorrência é feroz e todos o sabem. Ninguém quer ser o elo mais fraco. Existe uma constante intensidade que não se vê noutras culturas/empresas.
– Dinheiro Não É Tudo: Num ambiente como Silicon Valley onde a concorrência procura sempre ir buscar o melhor talento às outras empresas, Apple tem um enfâse diferente – paixão e não dinheiro. Ou a pessoa tem mesmo uma enorme paixão por trabalhar na Apple ou nunca iria ser contratada inicialmente. Os valores que pagam são competitivos, mas não é ai que está o poder da Apple – é na magia, por menos para quem acredita na Apple desta forma.
Para mais informação, leia o livro Inside Apple: How America’s Most Admired – and Secretive – Company Really Works de Adam Lashinsky.
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